Literatura

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CONTOS





Meu filho, de novo com essa toalha de mesa brincando de barraca? – Não é barraca mãe é a nossa casa.

- A tá, sei? tua e do Néni. Tá bom, quando é que vai parar com isso?

- Quem disse mãe? Que é só minha e do Néni?

- Tá Gui, deixa assim... Vá brincar!

Néni era o nome do cachorrinho de estimação de Lenita, a irmã mais velha, que adorava juntar-se a Guilherme na sua casa de toalha de mesa, com as orelhas em estado de alerta, como a observar alguma coisa.

                Nisso entrou Lenita. – Oh mãe! Quando é que a senhora vai mandar o Gui parar com essas brincadeiras? Olha só a cozinha fica uma bagunça. Até o Néni já entrou na dele. Olha lá, bem faceiro, nem dá mais bola para mim! 

                - Guilherme você anda assustando a tua irmã é? Acho melhor você parar com isso!

                - É mãe ele fica falando sozinho... Me dá até arrepios. A senhora não deveria deixá-lo brincar mais com esse negócio de montar uma barraca com a toalha de mesa e as cadeiras e se enfiar de baixo. Já viciou até o Néni! Os meninos da escola estão dizendo que ele é doido, quando eu falei dessa brincadeira.

                - Não exagera Lenita, é só coisa de criança, daqui a pouco passa!

                - Mas eu não gosto!

                Lenita era única irmã de Guilherme. Ela tinha medo porque já tinha flagrado o menino e o Néni de orelhas em pé, brincando à noite sob a luz de uma vela e falando sozinho, quando seus pais já dormiam. Ela ficou com medo de Guilherme atear fogo na casa por acidente, mas mesmo assim não falou nada a seus pais.

                - Miguel porque você me chamou? É noite e se a mãe e o pai me pegam aqui vão dar uma bronca e é bem provável, uma boa chinelada. Néni grunhiu como a concordar.

                - Mas não pedi para montar barraca, podíamos falar lá na cama onde você estava.

01

 

                - Tu não sabes que minha irmã dorme na outra cama ao lado, ela poderia escutar?

                - E tu precisa ficar falando alto? Não dá só para pensar?

                - Nunca vi ninguém falar pensando, sem dizer nada!

                - Tá já que estamos aqui, vê se fala baixinho para não chamar a atenção e acordar os outros. Vou te levar para um lugar para ti conhecer.

                - Onde fica esse lugar? E o Néni pode ir junto?

                - Deixa o Néni aqui vigiando a casa. Feche os olhos. Respire bem fundo e devagar três vezes. Bem devagarinho!

                - Tá já fechei. Estou pronto!

             - Agora vem comigo. Está vendo aqueles pássaros coloridos lá em frente?

                - Sim parecem grandes! São mesmos?

                - Vem, vamos nos aproximar de vagarinho, não podemos assustá-los.

                - Nossa! Os passarinhos que conheço, não são tão coloridos assim... E grandes!

                - Viu não se assustaram, estavam esperando por nós.

                - Que vamos fazer?

                - Montá-los.

                - Ué, não são cachorros e nem cavalos. Nunca ninguém falou que dava pra montar em pássaros! – Como se faz para subir neles?

                - Olhe ele abriu a asa. Você tem que subir entre a asa e o corpo, para que elas fiquem livres para ele voar. Veja como faço!

                - Vou fazer igual... Opa não deu, cai!

                - Tenta de novo!

                - Nossa ele é mansinho! E agora o que faço para me segurar?

             - Segure em algumas penas é fácil, veja como faço?

                - E agora?

                - Me siga!

              Os pássaros gigantes de plumagem multicolorida alçaram voo, deixando um rastro de luz fosforescente das suas cores correspondentes.  Guilherme estava encantado com o presente do amigo. Lá de cima olhava com largo sorriso de contentamento, olhava a paisagem encantadora lá em baixo. Rios de águas cristalinas. Dava até para ver peixes coloridos subindo e descendo a corrente. Mais a frente uma cascata que de tão alta suas águas pareciam tornarem-se nuvens branquíssimas. Ladeando o rio árvores deslumbrantes faziam sombra aos animais diversos que acorriam ao rio para saciar a cede.

02 

                      - Onde estamos Miguel?

                - Que pergunta? Voando pelo céu!

                - Ué não tem pessoas no céu?

                De repente uma voz – Gui, o que está fazendo aí essa hora? Deixa a mãe saber disso? – Era a irmã Lenita que despertara sem o irmão no quarto e indo até a cozinha onde lá estava ele debaixo da toalha com uma vela acessa.

           Como um passo de mágica o passeio pelo céu com seu amigo desapareceu, e se viu sozinho a luz de velas em sua casa formada por cadeiras, mesa e toalha. Assustando-se com o imperativo alerta da irmã, arrumou tudo e correu para cama.

                -Engraçado, não vi ninguém no céu? – pensou - Onde será que estavam todos? Tudo era muito bonito, colorido, será que é o que chamam de paraíso? Mas onde estavam as pessoas”?


                Gui, o café já está na mesa, te arrume ligeiro, já estás quase atrasado para a escola! – Tua irmã já está esperando.

                Mais uma manhã tranquila de Sol, dia lindo de outono. Não demorou muito e o ônibus logo chegou. Os irmãos sentaram-se na mesma poltrona, lado a lado.

                - Não quero mais saber do que fizeste ontem à noite. Se fizer de novo vou contar tudo para a mãe.

                - Tá bom eu não vou fazer mais!

              - O que é que tu fazias àquelas horas debaixo da toalha na cozinha? Não vê que poderias ter botado fogo na casa? Estava sonhando?

                - Não, só estava conversando com Miguel. Ele queria me mostrar uma coisa. Até me levou para um passeio no céu.

                - Passeio no céu! Que passeio?

                Neste momento o ônibus escolar parou em frente à escola e ambos desceram cada um indo para sua sala de aula.

                - Vou querer saber a história desse passeio, viu?

                - Tá!

               No intervalo da aula, Guilherme fez seu lanche e depois foi ao banheiro fazer a higiene. Enquanto isso, na sala de aula, alguns colegas de classe pegaram o seu penal e esconderam na mochila de outro menino chamado Artur, sem que este soubesse. Todos retornando a sala de aula. Guilherme sentiu que estava faltando alguma coisa sobre a sua mesa. Procurou por todos os lugares e não conseguiu achar. Deu-se conta que faltava o penal.

                - Guilherme porque não se sentou ainda? – perguntou a professora?

03

       - Por que não encontrei o meu penal. Alguém deve ter pegado.

                Os colegas que haviam escondido o seu penal, riam-se baixinho, até que a professora notou! Meninos tragam as suas mochilas aqui à frente. Revistou as mochilas dos três e não encontrou o penal de Guilherme. – Se algum engraçadinho ou engraçadinha pegou o penal do Guilherme entregue agora ou vou deixar toda a turma de castigo!

        - Ah profi assim não vale! Nós vamos ficar de castigo por esses bagunceiros? Todos começaram a resmungar ao mesmo tempo. – Fiquem quietos! Se quem fez isso não se identificar ficarão sim, todos!

            - “Ei Gui...psiu”!

            - Não posso falar agora, para de me chamar?

            - O profi, o Guilherme tá falando sozinho!

            - Parem com a algazarra, já disse! – A professora estava pronta para mandar uns dois para fora da sala de aula. – Quem não se comportar vai para rua agora, ouviram?

            - Fez-se um silêncio brusco, na confusão Guilherme já sabia onde foi parar o seu penal.

                - Professora – o que foi Guilherme?

            - O meu penal está na mochila do Artur... Mas não foi ele quem colocou!

               André, Julinho e Cesinha, ficaram pasmos! – Como ele descobriu?

            - Como você sabe que está na mochila do Artur, mas não foi ele que pegou? Você viu quem foi? – Artur me trás a tua mochila aqui.

          - Profi, não fui eu, não fui eu... – Só me trás a mochila. – A professora na primeira olhadela, encontrou dois estojos e perguntou a Guilherme: Qual é o seu? Esse com detalhes em vermelho têm o meu nome do lado. – Como veio parar aqui?

            - Professora não foi o Artur que colocou aí.

            - Se não foi ele, foi quem então?

            - A senhora sabe!

            - Ah, então eu sei. Não seria melhor você me dizer?

           André, Julinho e Cesinha de cabeças baixas e rosto rubros com medo que fossem delatados estavam ofegantes.

        - Cesinha, não adianta ele vai dizer para a profi! Alguém viu e contou para ele, estamos ferrados.

      - Cale essa boca André, fique quieto, ninguém viu. Se tu falar eu te mato!

     - Profi fui eu! – confessou André, não citando os dois amigos comparsas. Fui eu que coloquei o estojo do Guilherme na mochila do Artur.  – Mais alguém está envolvido nesse tipo de brincadeira de mau gosto para atrapalhar a minha aula?

04

 

Toda sala silenciou.

Lenita desde os primeiros anos de escola tinha o que poderíamos chamar de um dom de pintar tudo o que visse. Tinha uma facilidade incrível pela justeza e suavidade dos traços. Devido a isso sua mãe a tinha matriculado numa escola de pintura que havia na casa da cultura. Inclusive num dos primeiros três anos de frequência já havia participado de uma exposição de arte durante um evento que havia na cidade.

-Albertina, não deveria estimular muito a nossa filha nesses negócios de cultura. Arte no Brasil não dá futuro para ninguém. Vamos juntar o pouco dinheiro que temos e fazer uma poupança para ela fazer uma faculdade que possa possibilitar para nossa filha um futuro seguro.

-Luiz, meu querido, podemos fazer as duas coisas. Ela está nas séries finais do ensino fundamental, ainda tem todo o médio pela frente, até lá vamos deixá-la fazer o que gosta. Além do mais, a menina é estudiosa e não nos tem causado preocupações.

-Por falar em preocupações o que é que o Gui anda aprontando que ela está com medo?

- Coisa de crianças. Sabes aquelas histórias de amiguinho oculto. O Gui está com essa agora. A Lenita pega ele falando sozinho e morre de medo. Já falei para ela que é coisa da imaginação dele, mas mesmo assim ela ainda se assusta.


                     - Lenita, minha filha, o que é que o Gui anda falando sozinho que te espanta tanto?

- Ah, pai, ele conversa como se realmente estivesse presente ali outro amiguinho. Sempre que chego levo um susto, tenho medo que ele tenha problema de cabeça.

- Que isso minha filha! Teu irmão é uma criança normal como qualquer outra. Também é normal que nessa fase eles tenham essas atitudes. É bem provável que você quando na idade dele tivesse também uma amiguinha imaginária. O que ele conversa?

- Coisas estranhas, mas quando chego, ele para.

- Estranhas como?

- Ah um destes dias ele disse que fez uma viagem ao céu com seu amigo. Mas não me falou mais nada, além disso. Disse a ele que queria saber o resto dessa história.

- Está vendo. Não há nada de mais. Ele imagina o que aprende da gente. Nós criamos o céu, um lugar legal e o inferno um lugar ruim. Que está nas orações que ensinamos a vocês quando pequenos. 

05

- Está bem pai, mas vou querer saber o que tinha no céu do Gui, quem sabe não me dá um bom cenário para pintar? – risos.

-Falei com Leninha, hoje pela manhã. Me pareceu tranquilizada depois da nossa conversa. Disse que até iria fazer uma pintura do “céu do Gui”.

- Céu do Gui? Como assim?

- É ela falou que o amiguinho dele o levou para fazer um passeio no céu... Essas coisas. E ela cobrou que ele contasse a ela como foi esse passeio.

- Coisas de uma criança e uma adolescente. Precisamos habilidade para lidar com um e com outro. Não temos com o que reclamar com os nossos filhos, graças a Deus!


- Gui hoje você vai me contar sobre aquele passeio que você e o seu amigo invisível fizeram no céu, você me prometeu?

- Eu não prometi nada, você é que ficou insistindo.

- Então você não vai me contar? Se não me contar vou dizer para a mãe e o pai, o que tu estavas fazendo naquela noite na cozinha com vela acesa e tudo!

- Está bem! – Bem, eu fechei os olhos e logo me veio uma linda imagem de dois pássaros gigantes...

Então Guilherme relatou tudo o que lembrava do "passeio com seu amigo Miguel" para sua irmã.

06

 

- Que mais?

- Acabou. Você me chamou lembra?

- Que legal! Deveria ser muito bonito mesmo. Fiquei aqui imaginando. 

- E as pessoas, você não falou das pessoas?

- Não tinha ninguém, ao menos não vi!

- Agora fiquei curiosa... Mas esses pássaros gigantes são de mais. Tens imaginação fértil Gui. (Risos). Tá e o resto do passeio como foi?

- Não foi.

- Como assim, não foi?

- Você me chamou, lembra?

- Humm! Estranho este teu sonho né. Acho que já li alguma coisa sobre sonâmbulo.

- E o que isso, sonâmbulo?

- É quando a pessoa está dormindo e se levanta no meio da noite e sai andando. Perguntei para a mãe e ela disse que a pessoa está sonhando e que não se deve acordar. Ela pode se assustar.

- E o que acontece se a pessoa se assustar?

- Ah, isso ela não me disse. Mas você estava sentado embaixo da “barraca” e falando sozinho será que isso é uma espécie de sonâmbulo? Pois é, mas e de dia que tu fica falando sozinho também?

- Eu não converso sozinho, eu converso com o Miguel. Ele é o meu amigo, só que vocês não podem ver.

- Ah, então ele é invisível?

- Se invisível é o que não dá para ver, então acho que é.

- Como foi que você inventou esse amigo invisível?

- Eu não inventei, ele apareceu assim, e começou a falar comigo, convidar para brincar. Eu só fiz a barraca para ficar melhor. Agora que sabe da história não vai contar para a mãe ou o pai né?

- Não vou não, vai que de repente o Miguel fique bravo comigo e dai o que ele pode fazer né? uma vez que eu não o vejo. Olha só meu braço, me deu até um arrepio!

- Tenho uma coisa importante para lhe dizer amiguinho. Não é coisa legal, mais vai ajudar muito ela.

- Quem é ela, a Lenita? Vai acontecer alguma coisa com ela? Por que não me diz o que é? Então eu posso avisá-la para não deixar que aconteça nada!

- Ainda eu não sei quando vai ser e o que, mas todos irão ficar sabendo e nós dois vamos ajudá-la quando ela precisar.

-Você não pode me dizer o que é? – Guilherme estava com medo.

- Ainda não! Ela já começou a pintar o quadro da viajem né? Vai ficar muito bonito. Vou ajudá-la nos traços e cores. Ela tem o dom da pintura.

- Como é que você vai ajudá-la sem que ela saiba?

- Vou te dizer uma coisa que se chama inspiração, dá para conversar só com o pensamento sem falar nada. É o que acontece com nós dois. A Lenita, por exemplo, não te diz que falas sozinho?  É que ela não pode me ouvir, mas você me ouve, não é verdade? É assim que vou ajudá-la, tentando passar os detalhes assim como viste no passeio.

- Mas eu não vi tudo, ela me chamou e ai paramos. Falar nisso onde estavam as pessoas que não as vi?

- E porque sempre tem que haver pessoas? Elas poderiam estar em baixo das copadas fechadas das árvores, por exemplo. Como então poderíamos vê-las?

- É verdade né! Estavam em baixo das folhagens das árvores... Como será que elas são lá? Tem pássaros gigantes. Será que tem outros animais assim grandes como os pássaros que nos levaram ao passeio?

- Na verdade lá as coisas se equacionam de acordo com nossas necessidades. Pássaros para nos levarem ao passeio precisavam ser grandes. Isso não significa que todos os pássaros são grandes. Tudo é relativo conforme nossas necessidades.

- Entendi mais ou menos. Está certo, eu vi pássaros pequeninos lá também e eram igualmente belos! As nuvens de tão branquinhas pareciam algodão. Mas eram frias, por quê?

- Porque nuvens são águas no estado de vapor. Viu como ficamos úmidos ao passar por dentro delas?

- Agora vamos para a próxima etapa. Conhecer os campos e os acampamentos onde se reúnem as pessoas de que você fala. Mas já lhe adianto, pela sua inteligência que tudo é uma projeção melhorada do que vivenciamos na Terra.

 - Mas então isso não passa de um sonho mesmo! 

            - Você ainda é um espírito adulto em um corpo de criança. Mesmo no desdobramento, você ainda leva consigo as coisas de criança da atual vida terrena. Mas não teremos muito tempo até você perder essa conexão e não mais poder vir comigo. Feche os olhos.

                       Assim que Guilherme fechou os olhos logo se encontrava em um caminho rodeado de cevadas e trigo que formavam um campo dourado a perder de vista no horizonte. Ao longe aparecia uma cidadela. Foram caminhando em direção e Guilherme estava impressionado com o tamanho dos cultivares.

                    - Onde estão as máquinas e os celeiros para colher e armazena tudo isso? Não os vejo!

                    - Aqui não há máquinas e nem celeiros. Todos da comunidade vem até o campo e recolhem somente do de necessitam. Sabem que sempre haverá esse campo, porque já se habituaram  com o ambiente daqui.

                    - Mas o que há além daquelas montanhas sombrias distantes?

                    - Bem, lá vivem outras pessoas com comportamentos estranhos e perigosos.

                    - Você poderia me falar mais sobre elas? 

                    - Não! Você não  precisa conhecer o que se passa lá. Nossa missão é conhecer esse lado. 

                    Chegando na cidadela, Guilherme pareceu conhecer partes daquele lugar. E começou a se sentir estranho. Seu amigo o observava sabendo do que se passava.

                    - Engraçado. Parece que eu conheço algumas dessas pessoas? E aquelas crianças brincando? Conheço aquelas brincadeiras. Parece que já vivi em algum momento aqui? O que é aquela grande edificação?

                    - Lá Guilherme, é um centro de atendimento de pessoas que não conseguiram aceitar os costumes vividos aqui. Tem pessoas que trazem suas expectativas do outro lado e quando chegam aqui, querem continuar fazendo o que faziam.

                    - E porque não podem?

                    - Não podem porque aqui tudo pertence a todos e ninguém poderá se apropriar daquilo que é comum a todos. Então precisam ser levadas ao centro de atendimento para fazer uma limpeza da mente e se desapegarem das coisas que tinham do ou lado, pois esse tipo de coisa lá ficam e com o tempo se deterioram ou passam a ser posse de outros que vem depois.

                    - Miguel, eu não sei nada a respeito do que você fala. Mas esse lugar, realmente não é me estranho. Estou desconfiado que você está querendo me mostrar alguma coisa. Só ainda não sei o que é. Mas, uma coisa aqui é igual. As pessoas trabalham só que não vejo fabricas e máquinas. Eu não consigo entender isso. E as crianças não vão a escola? - Meus Deus!!! Aquela não é Lenita? O que ela  está fazendo aqui? Mas está tão triste, porque?

                    - Agora precisamos conversar sério amiguinho. Lenita não poderia estar aqui e temos uma missão evitar que ela venha antes do tempo.

                    - Mas ela já está aqui? Como isso? Vou lá falar com ela.

                    - Pare já! Você não pode fazer isso! 

                    - Porque?

                    - Porque você vai determinar que ela realmente fique aqui e lembre-se, onde está ela agora nesse momento?

                    - Aqui, não está vendo?

                    - Não, Guilherme, ela está na sua casa agora dormindo bem tranquila. Nós estamos aqui, ela não. O que você está vendo é uma projeção do que vai acontecer se nós não agirmos logo. Agora você não consegue entender mais um dia saberá.

                    - Ah, Manoel você é maluco. Só está querendo me assustar. Eu não estou entendendo essas coisas. Se ela está dormindo, como pode estar aqui? 

                    - Sabe quando a gente sonha Gui, vamos para onde estamos sonhando, como agora. Você não está realmente aqui, como Lenita, também não está. A realidade aqui não é igual a que se vive no mundo. Aqui tempo e espaço não existem eles estão somente em nossa mente que nos leva onde quisermos ir. Eu estou lhe acompanhando porque sua irmã precisa de nossa ajuda, mas não nesse momento e nem aqui. Ela vai precisar de nós lá no seu mundo.

                     Albertina era professora de artes na casa da cultura do município. Apesar de já aposentada, ia duas vezes por semana, ministrar aulas de pintura em tela às crianças matriculadas no curso gratuito. Diga-se de passagem, que a professora era voluntária desse programa na pequena cidade. A maioria dos pais preferiam matricular seus filhos em cursos que auxiliassem seus filhos a ter uma profissão mais promissora no futuro e segundo eles: arte não rende futuro para ninguém. Mas, mesmo assim algumas meninas e raríssimos meninos frequentavam o curso de pintura da professora Albertina que fazia das aulas uma ocupação gratificante naquelas tardes de terças e quintas-feiras.

            E falando de pintura, uma das alunas da professora Albertina era a nossa Lenita, cujo pai não pensava diferente dos outros, todavia a mãe incentivava a filha, porque ela apesar de sua simplicidade e da singularidade cultural da pequena cidade ficava por vários minutos a apreciar uma tela. Pensava na habilidade dos artistas na mistura das tintas para dar a tonalidade das cores, as sombras, a individualidade de cada detalhe que na composição geral tornavam um todo. Bem, ela ficava admirando e refletindo por um bom tempo. Sem contar o conceito que o artista deu ao conjunto. Coisa que Albertina, a professora, tinha vasto conhecimento. Pois ela não era professora de artes da escola da cidadezinha, mas sim de uma grande universidade da capital.

            - Lenita, você terminou aquela tela. Ficou muito bonita. Você tem um dom talentoso. Agora vamos trabalhar algo maior.

            - Como assim, maior, professora?

            - Penso que vamos aumentar o tamanho da sua próxima tela para que você amplie seu ângulo de visão. Vamos começar a praticar. Deixe-me ver uma tela maior que você poderia iniciar. Bem, creio que esta aqui é a única que dá para nós começarmos.

            - Ai... não tem menor professora? Essa é muito grande!

            - Não temos. Mas você vai conseguir. Não se preocupe com as dimensões, por enquanto. Você já tem alguma ideia para pintar? Ou quer ajuda?

            - Ah, professora. Tenho uma ideia! Vou pintar o céu do Guilherme.

            - Seu irmão fez um desenho do céu e você vai pintá-lo? Podes trazê-lo para mim dar uma olhada?

            - Ah professora, não vai dar. Não é um desenho. Ele sonhou e me contou como era ai vou usar a imaginação para pintar. Posso?

            - A tela é sua. Mostre-me o céu do seu irmão nessa tela. Fiquei curiosa! 

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Quando Lenita chegou da aula de artes, guilherme estava a brincar com o Néni, no pequeno espaço gramado que ficava em frente a casa. Era o momento de descontração depois da volta da escola antes do banho. Após as tarefas para dar início. Só mais tarde, depois da janta é que os irmãos ajustavam-se para falar dos acontecimento do dia. E foi em um desses momentos que o menino se mostrou preocupado com o que o seu amigo Manoel tinha lhe falado. Na verdade, ele não entendera quase nada, mas o pouco, já foi o suficiente. Queria partilhar com a irmã o que o amigo havia lhe dito, mas não o fez. Embora com a inocência de criança, Guilherme trazia algo de especial consigo e o respeito pelo amigo Manoel era superior ao ter que partilhar com Lenita algo que o amigo lhe proibira. – Que ajuda ela poderia precisar? Nunca falou que tinha qualquer problema! Mas não resistiu em perguntar:

- Lenita, você está bem?

- Bem? Como assim Guilherme? O que te falaram na escola? Foi o rapaz que apanhou que falou alguma coisa? – Lenita nem assimilou a pergunta do irmão e parecia uma matraca.

- Não, não. Só queria saber se estava tudo bem contigo, só isso!

- Eu estou bem, só ontem na aula de educação física me deu uma canseira danada. Engraçado! Sempre joguei vólei e nunca me senti cansada como ontem.

- Também não para de correr o tempo todos com as colegas! Não vai estar cansada?

- Seu bobo, estou falando sério. Me deu até uma tonteira.

- Tonteira? Bateu com a cabeça em alguma coisa?

- Claro que não né? Acho que foi do esforço do jogo!

Esse assunto não se seguiu muito longe e logo Lenita queria saber mais sobre as aventuras com Manoel. Guilherme lhe contou tudo o que podia, mas não tão alegre quanto na primeira vez. A presenta da irmã naquele lugar e naquela circunstância lhe aborrecera por demais. Até então não entendera porque Manoel não lhe deixou falar.

Lenita viajou ja imaginação com o irmão. Até mesmo o Néni está atencioso dentado sobre o tapete felpudo e com as duas patas sobre o nariz.

- Guilherme, está na hora!

- Tá, vou fazer a barraca.

- Esqueça a barraca, vamos!

Logo estavam de volta ao mundo encantado.

- Ué estamos de volta na mesma vila? Não deveríamos conhecer outros lugares hoje?

- Notou alguma diferença da outra visita?

- Sim tudo está mais colorido, este caminho está ladeado de flores multicoloridas... olha lá que tantos gansos em filha. Risos. Mas as pessoas continuam trabalhando. – Ué Manoel, elas parecem que não vêem a gente? Passam por perto e nem nos olham. Onde está a Lenita? Não vi!

- E não a verá, pois ela não está aqui. Estamos fazendo a coisa certa. Ela já começou a desenvolver o quadro das tuas imaginações. Por isso não está aqui.

- Ah, eu não entendo nada do que falaz Manoel. Não sou gente grande para entender essas coisas.

- Se fosses adulto não poderias vir comigo. Adultos não acreditam nos amigos ocultos das crianças. Eles tem explicação para tudo, até mesmo parra o que não entendem. Quantas vezes já ouvisse a palavra mistério? Quando chegam no limite da sua compreensão, chamam que é um mistério.

- Eu não entendo como pode estar aqueles pães sobre aquela mesa na rua e ninguém se importar com os que passam lá e pegam. Será que alguém que estava vendendo saiu por um instante e estão a roubar? Ué mais tem mais coisas lá na frente e não tem ninguém cuidando. Fiquei aqui pensando: quem rouba sai correndo ou se escondendo. Mas não vi a policia por aqui também. Que estranho!

Miguel observava seu amigo e notava o quanto ele já estava familiarizado com os costumes ordinários do mundo. Crescia com uma noção de que tudo tem que pertencer há alguém e deveria ser vigiado pois os ladrões existiam.

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